sábado, 10 de novembro de 2012

Combate a Gordofobia: uma Luta Feminista

"A mulher gorda, mais do que o homem, é segregada e anulada. Mas o peso que mais a incomoda não é aquele registrado na balança — é o da consciência. Quase inevitavelmente, as explicações dadas para a gordura apontam para o fracasso da própria mulher em controlar seu peso, seu apetite e seus impulsos. As mulheres que sofrem do problema da compulsão de comer (que ataca quase todas as gordas) suportam uma dupla angústia: sentem-se desajustadas socialmente e acreditam ser as únicas culpadas por isso. [...] Se torna cada dia mais claro que a gordura é uma questão feminista. Ela é um problema social, nada tem a ver com a falta de controle ou de força de vontade da mulher, mas pode se tornar uma curiosa forma de protesto." Gordura é uma questão feminista, de Susie Orbach, publicado em 1976.

Apesar de 35 anos terem se passado desde a publicação do livro de Orbach, o texto acima ainda se encaixa perfeitamente na nossa realidade atual.



Essa semana saiu a seguinte notícia: um médico que atende em um posto móvel, da Fundação José Silveira, empresa conveniada com à Secretaria de Saúde da Bahia, receitou para uma paciente obesa "cadialina". Quando ela perguntou onde encontraria o medicamento, ele indicou que ela procurasse um ferreiro e mandasse fazer seis cadeados. Para a boca, para a geladeira, para o armário, para o freezer, outro para o congelador e outro para o cofre. Se ela não quisesse seguir a "receita", ele indicou fazer 4 dias de jejum na semana e nos outros 3 dias só beber água.
O médico foi afastado, mas quando foi procurado pela mídia, respondeu o seguinte "Só usei uma linguagem figurada", "É uma paciente que tem compulsão por alimento. Infelizmente, ela vive numa comunidade que não tem capacidade de abstrair as coisas", e pediu desculpas "se foi mal interpretado".

E sabem o que me surpreende, é que notícias assim não tem grande impacto. Por que a maior parte da sociedade acha mesmo que tudo que precisa para emagrecer é "força de vontade" e "fechar a boca", afinal de contas "só é gordx quem quer". E é muito fácil de perceber isso analisando os comentários feitos na notícia.



Fonte: http://slutshamingdetected.tumblr.com

O preconceito não está só nas páginas virtuais, esta no mercado de trabalho, nas redes de ensino, nos meios midiáticos e, o que considero o pior de todos, nas nossas famílias. Em uma pesquisa realizada pela empresa Catho foram entrevistados 16 mil cargos de gerência, 59,1% deles afirmaram ter algum tipo de objeção na hora de contratar funcionários obesos. Em uma pesquisa do Hospital do Coração, 54% dos homens e 46% das mulheres afirmaram que não se casariam com uma pessoa obesa. Em um estudo realizado em um instituto de saúde em Nova York, 40% dos médicos afirmaram ter uma "reação negativa" em relação ao paciente obeso. Outro estudo, mostra que mulheres obesas recebem salários menores, como uma forma de "penalização", e que o mesmo não acontece a homens obesos e, também que, as mulheres tem um medo inconsciente, muito maior do que os homens, de engordar.



Fonte: http://slutshamingdetected.tumblr.com
Ofender uma pessoa por que ela é gorda não vai fazer com que ela emagreça, só vai fazer com que ela tenha sua auto estima ferida e seus sentimentos magoados. Quando você fala para uma pessoa gorda emagrecer, com a desculpa de que você só esta falando por que quer o melhor para ela, na verdade você só está procurando um meio de continuar expressando seus preconceitos. A mídia idolatra o corpo magro e, muitas vezes, anoréxico. O preconceito com as pessoas gordas não é uma preocupação com a saúde delas, é uma forma de controlar e engessar as pessoas nos estereótipos desejáveis pela mídia e pela sociedade, não se preocupando com os meios utilizados para alcançar o "corpo perfeito".


Uma pesquisa nos EUA mostrou dados alarmantes em relação a compulsão (reforçada pela mídia e pela sociedade) feminina de se enquadrar no estereótipos propagados pela mídia:
- 67% das mulheres estão tentando perder peso
- 53% das mulheres em dieta já estão com um peso saudável mas ainda continuam tentando emagrecer.
- 39% diz que se preocupam que o que elas comem ou quanto elas pesam vai interferir na felicidade delas.
- 37% diz que frequentemente pulam refeições para tentar perdem peso.
- 25% diz que ficaria muito chateada se ganhassem 3kg
- 26% eliminaram completamente algum grupo alimentar de seu cardápio
- 16% fazem dietas com menos de 1000 calorias por dia
- 13% fumam para emagrecer
- 12% diz que frequentemente comem quando não estão com fome, e 49% diz que de vez em quando fazem isso.

O resultado desta pesquisa é que 65% das mulheres entre 25 e 45 anos têm algum tipo de distúrbio alimentar, sendo que 10% tem sintomas de anorexia e bulimia, e 75% se comportam e pensam anormalmente em relação a comida.
E é por isso que a luta contra a gordofobia também é uma luta feminista, pois lutamos por igualdade de direitos para todxs. Ninguém é melhor que ninguém neste mundo. Não é por que a pessoa está em forma, que ela tem direito de se achar superior a uma pessoa gorda. Não é por que a pessoa se formou em medicina, que ela tem direito de se achar superior a um paciente que vive na periferia. Não é por que a pessoa é homem, que ela tem direito de se achar superior a uma mulher. Somos todos iguais, nem melhor, nem pior que ninguém.

5 comentários:

  1. Uma das verdades mais fortes no cotidiano é que a mulher sofre muuuito mais preconceito por ser gorda do que o homem. Vejo pessoas olhando com olhar de censura(isso quando não é de nojo mesmo) mais para mulheres gordas do que para homens gordos.Vejo em filmes adolescentes(ou não) personagens masculinos gordinhos e de personalidades fortes, que são corajosos, desbravadores. Mulheres gordinhas acho que nem passam pelo rascunho do roteiro. E isso é triste.

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    1. Depende da esfera social. Na comunidade hetero, pode até ser, mas na comunidade gay, ser gordo é pedir pra sair. Os olhares de nojo, a exclusão, o preconceito, até os filmes LGBT. Ser gordo e ser gay é uma coisa impossível de se imaginar, visto que é algo sujo e nojento. Sou gordo e sou gay. Sei bem como isso é.

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  2. Eu sempre fui uma criança gordinha. No decorrer do ínicio da adolescência tentei vários regimes para emagrecer, sem sucesso. Este ano, aos 17, finalmente consegui eliminar algumas medidas. Não é fácil, nem um pouco. Tive que fechar a boca mesmo, passar fome, às vezes tentava nem comer durante o dia. E assim em aproximadamente 4 meses perdi 10kg. Foi pouco pelo tanto de fome que passei. Para uma jovem de 1,57 que pesava 70kg (hoje me encontro com 60kg), estava pré-obesa...
    Infelizmente essa foi a unica opção que encontrei. Não tenho dinheiro para pagar academia, e sou muito nova para entrar em remédios (sem contar que acho que não vale a pena emagrecer com remédios, você acaba engordando o dobro). Não posso dizer que sofri bullying no decorrer da minha vida por ser gorda, mas posso afirmar que nos últimos tempos, não me faltaram palavras que me fizeram sentir mal. Uma simples brincadeira a respeito do seu peso, magoa.
    Ainda ouvi palavras da minha própria vó, palavras de nojo em que dizia que isso (ser gordo) era doença, e que era necessário emagrecer. Minha tia e prima são gordas, mas não podem ver algum gordo na rua que já falam com asco "Olha que gorda" ou coisas do gênero. É algo deprimente, e que me deixa mal. Qual o problema? Eu fui gordinha até agora e fui feliz. Ainda me encontro cheinha, sim, mas isso definitivamente nunca foi motivo para eu ser inferior ou superior a ninguém...

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  3. Fico horrorizada em ver a capacidade que o ser humano tem de ser cruel!!
    Nossa existem tantas leis de direitos civis então vamos criar uma para nos tbm!
    Se emagrecer fosse tão fácil, não seriamos gordinhas!!
    Tenho vergonha não de ser GORDA, tenho vergonha de conviver me um mundo onde as pessoas postam tais ofensas aos outros nas redes sociais!

    Bom final de semana a todas!
    Sempre seguindo, sempre torcendo!

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  4. Muito bom Aline. A leitura de Susie Orbach vale muito a pena.

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